O mundo vem passando por diversas complicações desde a eclosão da pandemia, causada pelo Coronavírus, tais como: o colapso da rede de saúde, a crise política e a econômica, que, por sua vez, impôs o fechamento de milhares de empresas, causando o aumento da taxa de desemprego, da violência, dentre outras graves consequências sociais.
Em relação ao aspecto econômico, é bem verdade que muitas empresas já se encontravam em instabilidade financeira há algum tempo, por razões diversas e particularidades de alguns setores da economia, todavia, é inegável que a situação agravou muito após o surgimento da peste.
A legislação brasileira, especificamente a Lei n. 11.101/05, prevê institutos jurídicos de alta relevância para o soerguimento das empresas, com a finalidade social de garantir a manutenção dos empregos, a geração de impostos e a circulação de riquezas, sendo eles, a recuperação extrajudicial e a judicial.
Embora muitos acreditavam que, no auge da pandemia, haveria um volume enorme de pedidos de recuperação (extrajudicial ou judicial), o atual cenário revela que o instituto, em que pese a sua eficácia para o enfrentamento da crise, não foi a primeira opção jurídica para as sociedades empresárias.
Segundo os indicadores econômicos e dados fornecidos pelo Serasa Experian, nos primeiros 06 (seis) meses de 2021, houve uma queda considerável nos pedidos de recuperação e de falência em relação ao mesmo período do ano de 2020 .
Em se tratando exclusivamente de pedidos de recuperação judicial, apenas em relação ao mês de julho de 2021, os pedidos diminuíram exatamente 42,2% em comparação a julho de 2020.
Em relação aos pedidos de falência, o resultado não foi tão diferente, haja vista que os dados indicam uma queda de 13% (treze por cento) no mês de julho de 2021.
Percebem-se, ainda, dos dados do Serasa, que as micros e pequenas empresas (ME e EPP), como sempre, foram as que mais sentiram os efeitos ruins da crise, enquanto que no total, os setores de serviço e do comércio foram os que mais requereram a recuperação judicial.
O economista Luiz Rabi, em recente matéria divulgada na imprensa nacional, entende que “a retomada da economia deve se manter no segundo semestre do ano, à medida que o cenário de saúde no Brasil demonstrar melhoras”.
Portanto, consoante aos dados do Serasa Experian, de janeiro a setembro de 2020 foram protocolados 955 (novecentos e cinquenta e cinco) pedidos de recuperação judicial no Brasil, enquanto que, no mesmo período de 2021, foram ajuizados 696 (seiscentos e noventa e seis) pedidos recuperacionais, isto é, o primeiro semestre desse ano fechou com uma queda de 27,12% dos pedidos de recuperação judicial no país.
Tais informações não nos levam a concluir que as empresas teriam superado a crise, mas certamente de que muitas encerraram diretamente as atividades, simplesmente, fechando as portas, como também que outras ainda buscaram superar os efeitos negativos da crise, não sendo possível afirmar, dessa forma, se haverá um pico nos pedidos de recuperação judicial ou, pelo menos, atribuir exclusivamente a razão do pedido de recuperação aos efeitos causados pela pandemia.
O lado positivo do cenário de acentuada recessão econômica, provavelmente um dos poucos, foi a celeridade do legislador em relação à reforma do sistema de insolvência brasileira, que acabou ocorrendo com o advento da Lei nº 14.112/2020, que alterou pontos significativos da Lei de Recuperação Judicial e Falência de Empresas (Lei nº 11.101/2005).
É inegável que o projeto de lei, ou melhor, os vários projetos que tramitavam no Congresso Nacional e que visavam alterar a Lei nº 11.101/2005, só tiveram a atenção devida dos parlamentares por conta do caos econômico causado pelo avanço da pandemia, em todo o mundo.
O sistema de insolvência no Brasil possui grande influência da legislação americana, especialmente no Capítulo 11 (chapter 11), do Código de Falência dos Estados Unidos, sendo considerada, conforme afirma o doutrinador Daniel Carnio Costa, sobretudo após a recente reforma, como uma das leis mais modernas do mundo sobre a insolvência empresarial.
Em síntese, a necessária e recente reforma buscou dar uma maior celeridade aos processos de insolvência, atribuiu novas funções ao Administrador Judicial, como auxiliar do Juízo, positivou regras sobre a falência transacional ou transfronteiriça, estimulou uma maior participação dos credores, inclusive com a possibilidade de apresentar o Plano de Recuperação Judicial, positivou o que a jurisprudência já admitia, em relação à prorrogação do stayperiod, alterou na classificação dos créditos submetidos aos efeitos da falência, regulamentou a possibilidade do Fisco requerer a convolação da recuperação judicial em falência, dentre outras significativas alterações.
Portanto, diante do quadro de crise econômico-financeira da sociedade empresária, o instituto da recuperação, seja ela extrajudicial ou judicial, poderá (deverá) ser a opção legal para buscar o soerguimento da atividade empresarial, criando-se um melhor ambiente para a negociação das dívidas, com a finalidade de manter a função social da empresa. Como dizem popularmente: pode até ser amargo, mas é o remédio legal e eficiente para a solução da crise das empresas.
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*Breno Augusto Pinto de Miranda, Advogado e Administrador Judicial. Atualmente exerce o cargo de Diretor do Instituto Brasileiro da Insolvência – IBAJUD e Presidência da Comissão de Estudos da Lei de Falência e Recuperação de Empresas da OAB/MT.